A travessia do Santos rumo à Série A do Campeonato Brasileiro não foi fácil. Mesmo com o time entre os primeiros colocados em boa parte da competição, o torcedor do Peixe pouco sorriu ao longo de 2024. As poucas exceções foram quando Baleinha e Baleião entraram em cena.
A dupla de mascotes serviu como uma espécie de desafogo para os alvinegros. Sempre bem-humorados, os dois irmãos – como os próprios se reconhecem após tantos anos de parceria – costumam se exibir antes dos jogos e nos intervalos, com danças, brincadeiras e diversas outras ações.
“É como se fosse o irmão mais velho e o mais novo. O mais velho, o Baleião, é um pouco mais controlado e o mais novo, o Baleinha, é mais piradinho, dança, anda de skate… Mas quando estão juntos, dançam juntos e tudo mais. A gente sempre se reúne antes dos jogos para combinar. Quando está o Neymar, por exemplo, fazemos algo especial para ele. A gente sempre pesquisa no dia o que podemos fazer”, disse Baleinha.
A missão de arrancar sorrisos nas arquibancadas começa cedo. A Gazeta Esportiva acompanhou um dia de trabalho da dupla, que não foi autorizada a dar seu nome verdadeiro.
As mascotes chegam à Vila Viva Sorte com cerca de três ou quatro horas de antecedência aos jogos. Antes de aparecerem no gramado, ainda há uma série de obrigações. Eles alegram adultos e crianças que fazem o tour do estádio e desfilam simpatia nas ruas que cercam a casa santista.
Do lado de fora do Urbano Caldeira, aliás, Baleinha e Baleião sofrem para dar três passos. O assédio é grande. São pessoas de todas as idades pedindo fotos. Neste período, a dupla ainda acha tempo para fazer algumas brincadeiras, como “morder” a cabeça dos fãs ou roubar algum artefato, como bonés ou bandeiras.
Já na parte de dentro da Vila, os irmãos transformam o gramado em um palco de show. Além da interação com o público nas arquibancadas, eles ainda mostram habilidade com a bola na barbatana.
“Essa é a melhor parte do trabalho. Quando as crianças estão com mascotes de pelúcia e chamam a gente para tirar foto, você vê o sorriso delas. A alegria do pai também, de realizar o sonho dos filhos. A gente vê a alegria de todo mundo ao ver o Baleinha e o Baleião. Para nós é uma alegria gigantesca. É a melhor parte do trabalho. É o que dá mais alegria poder ver o sorriso de uma criança”, disse o mais novo.
“É o que gratifica tudo, né? Às vezes a gente vai fazer um aniversário a 600 km de casa, vamos dentro de um carro, um lugar longe para ficar uma ou duas horas e logo já voltar, mas quando você chega lá e vê a alegria das pessoas, paga tudo. É diferente. Quando a gente entrou, não tínhamos essa noção. As crianças amam o que a gente faz. Eles não viram outras mascotes. Eles viram as nossas performances, nosso jeito de interagir”, comentou o primogênito.
“Eu acho que a identidade do Baleinha e Baleião caiu perfeitamente para nós. Você vê o crescimento que a gente tem. É gratificante”, completou.
A baleia passou a ser associada com o Santos nos anos 1950. E a história remete à Gazeta Esportiva. Messias de Melo, cartunista do jornal na época, fez um desenho de uma baleia como símbolo do clube, por ser um animal mais forte e imponente que o peixe. A ilustração se popularizou e, posteriormente, foi divulgada por outros meios de comunicação, passando a ser associada com frequência ao time da Vila.
Outros símbolos foram criados para ocupar o papel de mascote do Alvinegro Praiano, mas nenhum se tornou tão célebre quanto a baleia. Em 2006, então, o clube criou a dupla de orcas Baleinha e Baleião. Cinco anos depois, por meio do Estatuto, o animal foi oficializado como mascote do time.
Águas profundas
Baleinha e Baleião, porém, sabem que tudo tem limite. Eles estão sempre conversando para saber como será a exibição. Nos bastidores, também há toda uma equipe que os auxilia e orienta.
“Quando o Santos não está bem, é zero zoeira. Quando vai para o intervalo e o time não está ganhando, combinamos de se controlar mais, de não fazer muita brincadeira. Temos que entender que, por mais que a gente seja a alegria das pessoas, representamos o clube. Acaba sobrando para nós também. Se a gente faz alguma zoeira e o time está mal, a gente acaba sofrendo as consequências. Se o time não está bem, temos que ir devagar. Se está bem, vamos com tudo. Se ganha, esquece (risos)”, pontuou Baleião.
“A gente tem noção da responsabilidade que é, de ter esse cuidado com o personagem e a proporção que toma tudo isso. As pessoas mandam mensagens todos os dias para nós nas redes sociais para falar o quanto é importante o nosso trabalho. Tem todo um cuidado para fazer o personagem, tem uma equipe por trás. Não é à toa que somos considerados as mascotes mais carismáticas do mundo”, ampliou Baleinha.
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Os dois acompanharam de perto o inédito rebaixamento à Série B e classificam o dia 6 de dezembro de 2023 como o pior da vida deles. De lá para cá, entretanto, muita coisa mudou. A nova gestão, liderada pelo presidente Marcelo Teixeira, prometeu que iria reformular o clube e os incluiu na lista.
A direção fez alguns reparos no uniforme das mascotes e deu liberdade para que eles, mesmo em um ano complicado, seguissem trabalhando.
“Foi um ano de reconstrução para todo mundo. Quando muda uma gestão, muda tudo. Essa gestão ajudou muito a gente, várias coisas que estavam pendentes. Foi uma reconstrução de modo geral. Foi um ano que, mesmo sendo péssimo, de Série B, foi uma preparação para o ano que vem, que vai ser muito melhor. Eles deram tudo que a gente estava precisando, mesmo sem verba”, disse Baleião.
“Fazer parte disso é super importante. Passamos por vários processos aqui no clube. Fazer parte dessa reconstrução é bem interessante. Nós vimos o Santos cair e agora o Santos está se reconstruindo. A gente está fazendo parte disso. Ver isso acontecer é muito interessante. Dentro dessa situação que estamos, na Série B, ver o carinho do torcedor conosco é o mais legal. Todos os lugares que a gente chega, as pessoas falam que nós somos a alegria desse clube”, completou Baleinha.
O poder do sorriso
O dicionário define super-herói como “personagem de origem fictícia ou de caráter ficcional que, presente em histórias em quadrinhos, filmes, séries televisivas etc, geralmente possui superpoderes ou poderes sobrenaturais e tem capacidade para combater o mal”.
Alguns dos mais famosos são Homem-Aranha, Superman e Batman. Para os santistas, porém, tem uma dupla que poderia facilmente estar no mesmo patamar que todos esses: Baleinha e Baleião.
“Eu não me via (como super-herói). Mas a gente recebe tanta cartinha de criança que percebi que somos inspiração para muitas. Elas dão bastante desenho, canecas, são vários presentes”, disse o primogênito. “Não tem como separar. A personalidade do Baleinha e Baleião é a nossa personalidade. Demos o nosso melhor para as mascotes, que dão o melhor para nós, para nossa vida fora das quatro linhas”, ampliou.
“Com certeza. Somos super-heróis do Santos Futebol Clube”, completou o caçula.

Como bons super-heróis, os dois sempre buscam ajudar a todos. Assim, na medida do possível, as mascotes fazem visitas a alguns institutos e não escondem a emoção ao tirar um sorriso de crianças que estão passando por dificuldades.
“A partir do momento em que vem uma pessoa com limitações, temos que entender e deixar com que ela venha até nós. Já aconteceu deuma pessoa com Síndrome de Down ou com alguma paralisia vir até nós e dar cabeçada, brincar e tudo mais, aí a gente entra na brincadeira. É uma terapia. Já fizemos algumas visitas em alguns institutos”, pontuou Baleião.
“Você vê a alegria dessa pessoa que está passando por um momento difícil… Isso não tem preço”, finalizou.
Assim, arrancando sorrisos por onde passam, Baleinha e Baleião tiveram papel fundamental no retorno do Santos à Série A do Campeonato Brasileiro. Agora, os dois esperam que, em 2025, o time os ajude a levar alegria para todos os alvinegros.